quinta-feira, 3 de abril de 2014

UMA DICA VALIOSA


As campanhas eleitorais nem começaram e o debate nas redes sociais já está acalorado. Extremamente baixo e miserável, mas fervilhante. Porém, é possível identificar claramente alguns aspectos. Entre xingamentos e injúrias, conseguimos identificar superficialmente posicionamentos de esquerda, de direita (mesmo que alguns não saibam o que essa dicotomia realmente significa) e uma massa de espectadores que evitam a reflexão sempre que possível.

Boa parte dos militantes dessa direita, que hoje é oposição, está cometendo um pecado que o Lula já cometeu e deveriam ter aprendido com ele. Por duas vezes, suas tentativas fracassaram, mas quando finalmente conseguiu vencer, houve uma mudança de comportamento importante: ele virou o “Lulinha paz e amor”. Lembram?

O ex-presidente tinha um comportamento extremamente agressivo, que passava uma imagem carrancuda. Seus militantes também se comportavam dessa forma, em passeatas ferozes. É assim que tenho pelo menos na memória. Até que então tudo mudou e o barbudo que sempre gritava com o dedo em riste, dando milhares de adjetivos para seus oponentes, mudou de barbeiro, a cor da gravata, o tom da voz, o discurso, a escolha das palavras e se elegeu. Não que isso seja a fórmula do sucesso, mas contribuiu.

Hoje, boa parte dos militantes de direita faz o que o Lula fazia nas suas eleições que fracassou: gritam, xingam e esbravejam aos quatro ventos tudo o que está sendo feito de errado para eles. Não aprenderam nada com o “Lulinha paz e amor”. Cada coluna do Constantino e do Azevedo serve apenas para inflar alguns ativistas de hashtag e compartilhar ferozmente as brilhantes conclusões, como:

- Esses comunistas defendem os criminosos!
- A ditadura foi ruim, mas pior teria sido um golpe comunista!
- O negócio é fazermos justiça com as próprias mãos, mata todo mundo...
- Mas esse bolsa-família é pra pobre vagabundo que não quer trabalhar!
- Fora Corja! CorruPTos! Fora Dilma! Canalhas!

Me arrisco a dizer que isso não vai funcionar. Afasta as pessoas. Tem muita gente indignada com a corrupção realmente, mas fazer um levante contra aqueles que votaram no PT vai afrontá-los e não convencê-los a mudar de ideia nas próximas eleições. Eles já foram maioria e dizer a eles que foram burros não é uma abordagem muito amigável.

Sabemos que a história do PT não se resume ao mensalão, nem a do PSDB se resume ao trensalão. Resumir o debate a isso é miserável. Aliás, a Miriam Leitão já falou sobre isso (leia aqui). Quem entra nessa não está ajudando em nada. Inclusive eventualmente cometo esse pecado, quando volta e meia me pego xingando o Bolsonaro e vejo que a única coisa que consigo é irritar quem apoia o colega do Tiririca.

Precisamos atentar ao fato de que essa troca de ofensas só contribui para uma guerra pela conquista do poder, que é o que realmente está em jogo. O bem das pessoas, da gente, dos nossos filhos e familiares é outra coisa, que não está na pauta de quem nos governa ou quer governar. Triste mas é verdade. Por isso, desconfie de quem tem tanto interesse em tirar alguém do poder, sem propor nada. Se continuarem dizendo que a solução de tudo é tirar o PT do poder, sinto informar, mas as pessoas precisam de mais soluções do que essa, do contrário eles vão continuar lá.

sexta-feira, 14 de março de 2014

QUEM É O COITADINHO?



Me considero quase um nômade: nasci em Porto Alegre, fui para o Alegrete com 6 anos e com aos 16 cheguei em Bento Gonçalves, aonde vivo até hoje. Nesta época eu não tinha noção disso de forma tão esclarecida, mas sem dúvida foi a melhor escolha em termos de cidade para o caminho que eu estava iniciando, ao estar próximo das melhores faculdades e de um mercado de trabalho pulsante. Sou eternamente grato a minha família pela escolha.

Acontece que o ano mais complicado da minha vida foi esse, quando cheguei em Bento. A recepção foi muito estranha: aqui eu descobri que sou negro. Passei por diversas situações como por exemplo, ser chamado de preto sujo (inclusive por gente que convivo até hoje). Em uma situação ímpar, um senhor me dava o seu ponto de vista: “Não é porque tu tem essa pele mais escurinha, mas maldita a hora que a Princesa Isabel resolveu abolir a escravatura né?”.
Em casos mais recorrentes a conversa era assim:
- De onde tu é?
- Eu moro aqui em Bento.
- Mas tu não é daqui né?
- Não, sou de Marte. (mentira, eu dizia que era de Alegrete, mas depois de um tempo eu comecei a pensar em responder isso).
É muito estranho tu ser abordado pelas pessoas dizendo que o teu biotipo determina que tu não se enquadra na comunidade deles. Não fui preparado para me apresentar com selo de procedência. Fere valores de quem foi criado no meio de gente de todas raças e classes.
- Mas de que origem é a tua família?
- Olha é uma mistura grande, tem português, espanhol pelo lado da minha avó, deve ter um índio no meio...
- Hum, então tu é pelo duro lá da fronteira?
- Olha, nascer eu nasci em Porto Alegre, mas cresci em Alegrete...
- Hummmmm, tem mistura com bugres.
Não sei o que queriam dizer com isso, mas a sensação que sempre dava, era de que eu era um intruso. Não era legal. Mas hoje me enche de orgulho saber que faço parte de um país miscigenado. Como dizia num livro que tive acesso: “as famílias de um bairro de Bento eram predominantemente da raça brasileira”. Nem sabia que ser brasileiro era raça, mas se for, sou dela.

Esse é um lado da história. Mas de lá pra cá fiz muita coisa boa em Bento, aprendi muito, criei amizades maravilhosas. Me tornei o profissional de comunicação e marketing que me orgulho, graças ao que aprendi aqui. Além disso, fui muito bem recebido por famílias de origem italiana, tive namoradas e inclusive tenho um filho com uma gringona linda. (detalhe: que mistura linda ficou o nosso filho). Tenho tantas histórias alegres, quanto tristes.

Sofri racismo e fui amado. Continuarei sofrendo racismo? Ninguém pode garantir, mas tenho certeza que continuarei sendo bem tratado por essa cidade que me acolheu e deu muito para a minha família. Tive colegas e amigos no meu primeiro ano aqui, aonde muitas vezes eu tive a sensação que estavam cuidando de mim. Se certificando que as outras manifestações não chegassem perto de mim. Todos sabíamos que elas existiam.

Hoje, em 2014, costumo dizer para as pessoas que vêm de outras cidades: agora é mais fácil, tu vai te adaptar. É um fato. Esse tipo de racismo, hoje velado, já foi escancarado. Quem me julgava pela pele mais escura, hoje sabe que tem que ficar calado, do contrário vai dar zebra. E dá mesmo. Mudou o que ele pensa? Não sei, mas proibir de dizer essas coisas ajuda bastante. Pelo menos não me incomoda e não alimenta a burrice coletiva.

Falar do racismo em Bento não é coisa do passado ou de minorias insignificantes. Acho que é uma sujeira que precisa ser eliminada e não escondida em baixo do tapete. É botar as cartas na mesa e deixarmos claro que quem pensa assim, deve ficar calado. Não, não pode xingar ou diminuir ninguém pela sua cor e ponto final. Sacou?
- Mas então não pode nem chamar um alemão de alemão?
- Se ele não gosta, não pode.
- Mas tu te importa que eu te chame de negão?
- Se tu estiver querendo ser carinhoso comigo, eu vou entender. Se tu quiser me ofender eu vou entender também.
Ninguém trouxe o assunto a tona para prejudicar a cidade. Quem tem interesse nisso? Aconteceu e talvez hoje estejamos pagando pelos erros do passado, que devemos erradicar, com educação e diálogo. Me incluo nisso, pois acho que é um problema que a solução também passa por mim, afinal sou daqui (posso dizer isso?).

Não escrevi esse texto para me fazer de coitadinho, muito pelo contrário, amo minha vida em Bento, sou feliz aqui e acho que o juiz de futebol não se fez de coitadinho. Como diria o Caetano Veloso: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Me vi lembrando de muita coisa, com toda a discussão por causa do caso, precisava compartilhar.

- Putz, mas essa história de defender negros, direitos humanos... querem é se fazer de coitados para ganhar cotas disso, bolsa daquilo...
- Oi?
Esse último suposto diálogo nunca aconteceu comigo. Acho que nunca aconteceria e se acontecer a culpa não é de Bento, com certeza não. Mas se um dia rolar, escrevo outro texto para contar.

sábado, 7 de dezembro de 2013

NÃO VIVO SEM MÚSICA



Eu e minha mania de escrever sobre reflexões que acabei fazendo em momentos cotidianos. Dessa vez o fato aconteceu faz muito tempo. Tanto tempo, que nem lembro quando foi. Mas basicamente diz respeito à música, ou melhor, a minha sina de ser músico (se é que ainda posso ser classificado assim).

Estava eu no banco pagando uma conta e um conhecido, da época do segundo grau, entrou na fila comigo. Começamos a bater um papo e o tema da conversa rumou para “E aí, muitos shows? Tocando muito?”. Se as perguntas tivessem terminado assim, não seria muito diferente do que acontece até hoje. Muitas pessoas que me conhecem, sabem que eu toco e adoram puxar assunto assim. Mas o caso em específico terminou com uma pergunta especial, que muitos talvez tivessem a vontade de fazer: “ainda não desistiu do sonho da música?”.

Por um instante quase fiquei ofendido com a pergunta. Nunca sonhei com a música, ela é uma realidade na minha vida e na vida de muita gente. Para tentar explicar não vou nem rebuscar a memória e vou usar a música que estou ouvindo no momento que escrevo o texto:

“Quando a gaita chora
O sorriso aflora, a saudade estanca
Quando abre o fole
Arrepio na pele, nó na garganta
(Quando a Gaita Chora – Érlon Péricles e Zelito Ramos Souza) via Rádio Tertúlia

Simples assim. Estou aqui ouvindo música, na voz da Shana Müller, me emocionando com o que ela diz, com as letrinhas e as notinhas que emanam dela. Acho que as pessoas confundem as coisas quando a gente se dispõe a subir no palco para cantar e tocar um instrumento. Eu não almejo ser o Eric Clapton ou o vencedor do The Voice. A música faz parte da minha vida e eu não imagino o mundo sem ela. Dei sorte de saber tocar e cantar.

A minha família é muito musical e talvez esteja aí a explicação. Dona Zulmira G. Trindade Pereira da Costa, minha mãe, é Bacharel em Direito, cursou Belas Artes, se aposentou como escrivã e desde que lembro do mundo, ela toca piano, lendo partituras de tango e música clássica na sala de casa. As primeiras aulas de piano que tive, foram com a Vó Purcina, mãe do meu pai. Depois disso, quando resolvi aprender alguma coisa no violão (dado pelo pai Wladimir Pereira Costa) a Vó Rosa veio com um disco do Baden Powel, dizendo: Se tu quer aprender violão tem que ouvir esse aqui.

Isso tudo não foi sonho, juro que foi tudo real. Se já subi em palcos e cantei para alguém ouvir, mas honestamente não sei explicar se foi porque me pediram ou eu que fui atrás disso. Mas sei que nunca foi algo que dissesse respeito a essa áurea que se faz em torno da música. Nunca me imaginei no palco do Planeta Atlântida, no programa do Jô ou vendo uma multidão cantar uma música minha. Gosto de tocar, cantar, compor e ponto. Sou péssimo para lidar com o que rola daí em diante, talvez justamente por nunca ter sonhado.

Conheço muita gente que colocou o instrumento em cima do guarda-roupa, sob o argumento de focar na faculdade, na empresa ou no filho que acabou de nascer. Não é o meu caso. Não tenho um cantinho escondido em casa, com uma coleção de guitarras e violões. Tenho violão rolando pela casa, que o Frederico sempre teve a disposição para fazer o que quisesse, às vezes esqueço ele no porta-malas depois de um show e se der o acaso de eu estar com ele em qualquer lugar e der vontade, eu toco ou abro o peito facinho.

A arte de uma forma geral, abre meus olhos para muita coisa. Abre os poros para muitas sensações que gente insensível não percebe. Do que o Chico Buarque estava falando na letra de “O que será”? Quando pequeno eu imaginava e ficava com medo. Isso me interessou a descobrir do que ele falava, que era tão assustador. Hoje eu entendo o que aconteceu no Brasil na ditadura. O Renato Russo cantou “Você diz que seus pais não entendem, mas você não entende seus pais”. Me ajudou em muitas discussões juvenis. Quantas coisas o Vinícius de Moraes me inspirou para ser apaixonado, como é bom sofrer de amor por uma mulher. Juro, tudo isso é muito real, nada foi sonho.

Hoje tenho minha empresa, dou aulas na faculdade e também faço shows, com o Ópera Pampa ou sozinho (ultimamente muito pouco ou quase nada). Mas isso não significa que eu esteja sonhando e esperando algo. A música segue comigo, ouvindo meus artistas favoritos, ouvindo as músicas do Wladimir da Costa, cantando com o meu filho na hora de dormir (de bagunçar também) ou anotando temas para quem sabe um dia voltar a compor. Não vou esconder nada. Resumindo, não ganho a vida com a música, mas não vivo sem música.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

UMA NOVA FORMA

Com o alvará devidamente concedido pela minha gringa, me bandeei para a capital na noite da última terça, dia 12 abril, com a missão de assistir pela primeira vez o show do Pirisca Grecco y La Comparsa Elétrica. Primeira apresentação no Dhomba, o show faz parte de um projeto batizado de “Clube da Esquila”, que vai acontecer uma vez por mês por ali, sempre contando com convidados especiais. A estréia foi com a participação do Tonho Crocco (Ultramen) e do Zelito.
Ao lado de Lenine, Jorge Drexler, Mombojó, Julieta Venegas, Marcelo Camelo e Fito Paez, o Pirisca faz parte da trilha sonora da minha vida nos últimos anos. Parece estranho dizer isso de alguém tão próximo. O cara é de Uruguaiana e também participa de um festival lá em Manoel Viana, na beira do rio Ibicuí, aliás, rio que eu tenho como o rio da minha infância.
Mas vamos ao show. O tema abre alas foi “Co’as espora torta”, (parceria do Pirisca com o Tulio Urach e Tukano Netto), que é um primor de obra. Letra e música maravilhosas, que não tem o que tirar nem por. Dali em diante é um abraço. O desfile continua com Jeito Gaúcho, Milonga Bruxa, Muchas Gracias, Zambita Nueva, e diversas outras belíssimas canções da discografia do Pirisca.
Como era previsto então, rola a canja do Tonho Crocco e o show ganha ainda mais força no seu significado: o que é regional se lança para o mundo porque é universal. Além de músicas do próprio Pirisca, Tonho interpreta músicas da Ultramen, Amigo Punk, músicas do seu trabalho solo e até direito a uma citação de Guri, do César Passarrinho (João Batista Machado / Júlio Machado da Silva Filho).



A essas alturas um desavisado iria começar a se questionar aonde estamos. Sim, a descrição é de um lugar extremamente urbano na cidade baixa, capital do Rio Grande do Sul, com pessoas de bombacha, tomando cerveja e outros de chapéu de sambista, camisa branca e bermuda, ao mesmo tempo que falam de coisas do campo, da alma, do peito, do mate. Uma mistura enorme, que dá a sensação de uma roda aberta. Todos são bem vindos a ouvir o que temos para dizer sobre o nosso chão, a nossa terra e dizemos de um jeito que todos vão entender.
Na finaleira rola a participação do Zelito, com um nova versão para "Esquilador" do Telmo de Lima Freitas. Essa foi como um tapa na orelha. Juro que fiquei atordoado. O meu comentário depois do show devia ser chato de tão repetitivo (a cerveja ajuda na redundância): o meu filho (que deve nascer ainda no mês de maio) vai ouvir Telmo de Lima Freitas com naturalidade. Se eu ligar o DVD na sala, enquanto fazemos o assado de domingo ou a janta na semana, vai despertar tranqüilamente os sentidos do guri. Ele não vai rejeitar porque vai ser parecido com ele. 
No ano passado fiz um curso na Perestroika e uma das coisas que o Felipe Anghinoni e o Tiago Mattos dizem é que existe uma revolução acontecendo revendo o jeito de se fazer tudo no mundo. É um fato. Tanto nos negócios, como na publicidade, nas artes e na vida, existem novas formas nascendo. O que eu vi e tenho ouvido tanto da obra do Pirisca pra mim é isso: uma nova forma de cantar o Rio Grande, para que o mundo te escute e entenda. Com tudo o que está a nossa disposição hoje através da internet e a nova forma como as pessoas se relacionam, o tradicionalismo precisava disso, não pode ficar de fora. São dois movimentos de mudança: quem produz a arte e de quem consome. No âmbito regional esta mudança de fato está acontecendo com ainda mais força.
Não posso ser injusto e deixar de comentar que tem mais gente fazendo isso, achando novas formas. O Quartcheto tá com uma obra fantástica, o Borghetti leva a música para a Europa desde que eu me conheço por gente, além de diversos outros que eu nem saberia listar, por tantos que são: Bebeto Alves, Geraldo Flach, Vítor Ramil, Kleiton e Kledir, Mário Barbará, Yamandu Costa, entre tantos que fazem parte dessa corrente. A diferença é que o momento é mais propício, a internet vai facilitar muito as coisas e o Pirisca tá ligado nisso. Não é só fazer um site legal e simplesmente estar na rede social do momento. A nova forma que o Pirisca está praticando alcança um patamar muito contemporâneo.
Meu desejo é que o projeto "Clube da Esquila" seja um sucesso no resto do ano. Que lote aquele lugar todos os meses e que cada vez mais pessoas estejam por lá participando. Me agrada saber que a arte com cara de pampa esteja rompendo as fronteiras e sendo sentida por todos os cantos, sem preconceitos. Já dizia o Cabo Deco:

"une as vozes num só canto
todos na mesma canção
abandona o preconceito 
e toca um jazz no galpão."


quinta-feira, 31 de março de 2011

SOU UM BAITA OPORTUNISTA

Admito que sou um baita oportunista. Pelo menos no meu blog consigo ser. Quando tem algum tema em evidência logo corro aqui para escrever e entrar na discussão do momento, tornando o meu blog super visitado. Foi assim quando escrevi um texto sobre o caso do Ronaldinho (ex)Gaúcho com o Grêmio: recorde de acessos no blog.
Confesso que não era o assunto mais importante a ser tratado naquele momento. Com tanta coisa mais relevante e útil para a sociedade, eu fui perder meu tempo dissertando sobre futebol e o orgulho gaúcho que esperávamos que o dentuço tivesse. Uma grande besteira e lá estava o índice de visitas no meu blog nas alturas “bombando” como normalmente não está. Puro oportunismo.
Com o fato de a Ângela Vieira ter dito ao final da sua bela apresentação da peça “O Matador de Santas”, na Fundação Casa das Artes, na última noite de terça, dia 29 de abril, vou entrar na onda dos muitos oportunistas que também deram as caras e dar o meu pitaco.
Depois de elogiar a cidade, a hospitalidade e o belíssimo teatro que temos, Ângela pediu que as autoridades concluíssem as obras que dão infra-estrutura aos artistas nos bastidores. Segundo ela: “vocês não enxergam, mas aqui atrás precisa ficar tão bonito quanto o que vocês estão vendo aqui na frente”.  Não sei se foi literalmente assim (quase), mas o que importa é que bastou pra gerar notícias em sites, jornais e discussão nas redes sociais, entre os bento gonçalvenses.
Claro que uma atriz da Globo, com uma vasta experiência, se apresentando nos melhores teatros do Brasil, com regalias que uma global precisa, realmente deve sentir a falta de estrutura ideal. Mas também pela poderosa bagagem que tem, deu conta do recado e não diminui em nada a qualidade do seu belo espetáculo que emocionou a todos.

Aliás, será que alguém sabia dessa pendência na Fundação Casa das Artes? Até então alguém tinha se incomodado com o fato de os bastidores do palco estarem inacabados? Porque as pessoas estão dando importância a isso? Estão sensibilizados com a estrutura ideal para os artistas poderem re alizar os espetáculos? Querem saber das outras dificuldades dos artistas além do Palco inacabadoA conclusão da obra de fato ainda não terminou, faltam diversos detalhes técnicos. 

Apesar desses pesares técnicos, essas pendências na obra não impediram em nada que fossemos agraciados com uma lista enorme de artistas que desfilaram naquele palco. Tivemos lá: The Beats (considerado o melhor cover dos Beatles), Orquestra de Caxias do Sul (com a fabulosa peça os Saltimbancos), Primeiro as Damas, O Analista de Bagé, Renato Borghetti, Tom Zé, Lucio Yanel, Orquestra da Ospa, além de diversas atrações que permearam a Semana da Música e até oportunidades para artistas daqui, inclusive o Ópera Pampa (do qual faço parte) subiram no palco com toda pompa de estar tocando no Teatro.

Para o artista é nobre se apresentar em um teatro. As pessoas sentadinhas, confortáveis, apreciando e prestando atenção no teu trabalho, nos teus sentimentos, nas tuas crenças e no fim, naquilo que os artistas querem que as pessoas levem nos seus corações. Mas o mais importante é as pessoas estarem lá, que tenha público e se puder, que o teatro esteja lotado. A arte não faz sentido sem alguém para tocar e ser tocada, receber algo em troca: suspiros, palmas, gritos, vaias, sorrisos, gargalhadas ou lágrimas. O público sempre toca o artista de alguma forma.

É revoltante ir num show maravilhoso como o do Tom Zé, que é uma entidade da música brasileira e a casa não estar lotada (não estava lotado, acreditem). Tom Zé merece casa lotada. Imaginem a tristeza de um maestro (como o da UCS) que preparou um especial para o Dia das Crianças, com uma releitura dos Saltimbancos, do Chico Buarque e termos cadeiras vazias no teatro. Muito triste. Assistir ao maravilhoso show do Marcelo Caminha, no SESC, ao lado de não mais que 20 pessoas é algo igualmente triste. Poderia ficar horas aqui lembrando belos espetáculos que estiveram em Bento e não receberam do público o prestígio que indiscutivelmente mereciam.

Que maravilha saber que tantas pessoas estão tão preocupadas com o bem estar dos artistas. Aquela obra inacabada realmente é um problema para quem está no palco, principalmente em dias frios. Acredito que os artistas que possam por ventura usufruir daquele palco, devem estar radiantes ao ver a preocupação de tantas pessoas com o bem estar dessa classe de trabalhadores. Estão sensibilizados conosco. Aonde já se viu um músico tocar com frio ou um ator interpretar sem um camarim decente que lhe dê suporte. É confortante ver as pessoas preocupadas com isso.

Porém,lhes garanto que nada é mais frio que uma cadeira vazia em um teatro. Espero que esses que criticaram tanto o fato do momento, sejam fiéis espectadores da rotina cultural da cidade. Tenho certeza que muitos deles pouco ou nunca foram naquele teatro. Mas tenho certeza que os próximos artistas que passarem por lá, ainda preferem passar o frio vindo da falta de estrutura, do que pelo frio de um teatro vazio.

Senhores, sejamos dignos de merecer os investimentos que esperamos que aconteçam lá. Vamos prestigiar sempre o que for oferecido no âmbito da cultura, pois essa é a nossa moeda de troca enquanto cidadãos. Deixemos de aproveitar o fato para descascar uma administração pública e passemos a olhar para os nossos umbigos, se como espectadores estamos fazendo por merecer o que está sendo ofertado. 

Não, não estou defendendo esta e nenhuma outra administração municipal. Não sou filiado a nenhum partido por um motivo muito simples: nós somos a força da mudança em tudo na sociedade. Não acredito que ela partirá de nenhum governo ou partido. Portanto, deixemos de ser oportunistas em justificar o nosso fracasso na falta de prestígio a cultura e sejamos construtores de algo melhor para nós mesmos.


domingo, 9 de janeiro de 2011

Sirvam nossas façanhas

Vou começar esse texto de hoje de um jeito bem meu: vou fazer uma longa introdução até chegar ao ponto que quero.
Pois bem, durante o período de 2006 até o meio de 2010 trabalhei em uma empresa que me proporcionou conhecer diversas cidades do Brasil. Foi um período fantástico, conhecendo as peculiaridades de diversos lugares desse nosso país tão plural. Mas as coisas que mais me impressionavam eram: a reação e a expectativa das pessoas ao saber que eu era gaúcho.
Tirando eventuais piadinhas e brincadeiras, que normalmente mais ajudavam a iniciar um bate papo informal do que qualquer desconforto, as pessoas passavam respeito diferente ao saber da nossa origem. Era como se apartir do momento que soubessem de onde eu vinha, um pedaço da minha personalidade já devia ser conhecida.
Honestamente acho isso ótimo. Ser gaúcho realmente tem algum significado, que vai muito além da imagem caricata, que muitos costumam construir de um peão de bota e bombacha com sua prenda de vestido. Além de algumas definições do termo Gaúcho no Wikipedia, Gaúcho e os livros Martín Fierro, de José Hernández e Rodeio dos Ventos, do Barbosa Lessa, são ótimos como ponto inicial para quem nunca pensou nisso.Mas como músico que sou, acho ótimo poder recorrer a trechos de algumas obras que explicam com perfeição para mim:

Gaúcho, do Nico Fagundes
“... São os homens de a cavalo 
que agarram o céu com a mão, 
rasgando fronteira e chão, 
marcando terneiro a pealo, 
bebendo o canto do galo 
no alvorecer do rincão...”
Jeito Gaúcho, do Pirisca greco e Miguel Azambuja
“Esse meu jeito gaúcho tá no violão
Em cada fio de bigode, no aperto de mão
Tá no amargo do mate, tá no afago do catre
Na poesia e na canção...”

Gaúcho – Rubem Solfildo da Silva
“...Gaúcho é nome e herança,
Que os bravos heróis nos legaram,
Que muito mal empregaram
Não compreendendo por certo
Gaúcho é altivo, esperto,
Espontâneo, inteligente,
Respeitador bom amigo,
Mas quando encontra o perigo,
Costuma chegar de frente...”

Pra o Meu Consumo, de Gujo Teixeira e Luiz Marenco
“...Têm coisas que tem seu valor
Avaliado em quilates, em cifras e fins
E outras não têm o apreço
Nem pagam o preço que valem pra mim...”

No final das contas, tento levar a vida de forma a merecer assim ser chamado. Quando me chamam gaúcho, sinto um orgulho enorme e ao mesmo tempo uma grande responsabilidade. Mas hoje, sinto uma revolta em como pode um boleiro da estirpe do Ronaldo, carregar no seu nome para o mundo todo, algo que ele com certeza não sabe o que significa.
Mesmo torcedor do meu glorioso Internacional, colorado fanático e um grande secador do nosso vizinho tricolor, me senti envergonhado demais com os fatos que todos vimos agora em torno da volta dele para o Brasil. Definitivamente as atitudes e escolhas desse rapaz, (tanto no passado, como as de agora) não dizem respeito a alguém que faça por merecer carregar a expressão Gaúcho no seu nome.
Espero que isso tudo não seja um sinal de que esses valores estejam se perdendo. Que esse rapaz mantenha distância do nosso estado e faça uma manifestação pública de que ele não quer mais que seja vinculado ao termo Gaúcho. Que as próximas gerações continuem aprendendo que existem coisas maiores que o dinheiro (coisa que acredito que ele já tenha o suficiente) e que o nosso hino seja cantado cada vez com mais verdade dentro dos nossos peitos.


“Povo que não tem virtude, acaba por ser escravo...”


Que de uma vez por todas, não sejamos escravos do dinheiro. Amo o meu estado e o meu país e com certeza não quero passar necessidades, mas foi aqui que aprendi a ter vergonha na cara, coisa que acho que esse cara não aprendeu nada.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

As Razões do Boca Braba (João de Almeida Neto)

Me chamam de boca braba
Não sabem me analisar
De gênio eu sou uma cachaça
Mas de alma, um guaraná
Só não me péla com a unha
Quem pretende me pelar
E depois que eu fico brabo
Não adianta me adular

Eu sei que é em mim que deságua
Quase que cento por cento
De todo o ressentimento
Desta gente que tem mágoa
É porque não bebo água
Nas orelhas dessa gente
Que adora mostrar os dentes
Por não terem fé no taco
Ficam grudado no saco
Dos políticos influentes

Me chamam de boca braba
Mas eu nem brabo fico
Não desfaço quem é pobre
Nem adulo quem é rico
Quando eu gosto, elogio
Quando não gosto, critico
E onde tem galo cantando
Eu vou lá e quebro-lhe o bico

O meu jeito há! há!
O meu jeito conforme já tenho dito
Pra uns é muito bonito
Pra outros, o meu defeito
Mas talvez seja o meu jeito
Que me troque de invernada
Cada um tem sua estrada
Seu lugar, seu parador
A abelha gosta da flor
A sarna, da cachorrada

Me chamam de boca braba
Esta gente tá enganada
Eu tenho é boca de homem
E tenho opinião formada
Sei qual é a boca que explora
Sei qual é a boca explorada
E é melhor ser boca braba
Que não ter boca pra nada.